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domingo, 1 de abril de 2012

RELATO DO FILHO DE PAIVA NETO ASSUMIDO GAY

Ex-gerente da LBV conta em livro a perseguição que sofreu ao assumir-se como gay e namorado do filho de Paiva Netto, presidente da entidade
Fundador da Legião da Boa Vontade (LBV), o radialista carioca Alziro Zarur morreu há 21 anos anunciando que o mundo acabaria em 2000. O “homem que fala com Deus”, como era chamado na década de 50, apelou para o discurso apocalíptico ao fundar a seita religiosa que se propagou de norte a sul do país. Ergueu um império sobre os pilares da generosidade: acudiu crianças carentes, amparou idosos, pregou o desapego a bens materiais. Hoje a LBV está entre as seis organizações filantrópicas que mais arrecadam no planeta.
Veio o ano 2000 e o mundo não se desintegrou. A confiança na entidade, porém, está desmoronando. Cerca de 2 milhões de brasileiros repassaram, só no ano passado, R$ 215 milhões aos cofres da LBV, uma dinheirama que, segundo denúncias publicadas pelo jornal O Globo, custeia ambições terrenas dos homens que hoje comandam a máquina da caridade. O alvo das investigações de uma CPI na Câmara dos Deputados tem nome e cargo definido: chama-se José Simões de Paiva Netto e ocupa, desde 1981, a presidência vitalícia da LBV.
Herdeiro de Zarur, Paiva Netto tem mais encrencas pela frente. Dentro de dez dias, Pedro Almeida, um carioca de 30 anos, lançará em São Paulo o livro Desclandestinidade – um homossexual religioso conta sua história. Ele vive há seis anos com o primogênito de Paiva Netto, o artista gráfico Franklin de Paiva, de 34. Os dois se conheceram na entidade. Apaixonaram-se e, quando o caso veio à tona, foram expulsos.
Título
Desclandestinidade – Um Homossexual Religioso Conta Sua História
Autor
Pedro Almeida
Editora
GLS, de São Paulo
Preço e páginas
R$ 20/144
Perseguidos por legionários, dividem um minúsculo apartamento em Lausane, na Zona Norte da capital paulista. Pedro trabalha numa editora, Franklin vende ilustrações. O livro não se restringe ao árduo caminho dos gays que se assumem. Vai mais longe. Revolve as entranhas da LBV. Nesta entrevista a Época, Pedro diz que irá à CPI, se convocado for. Franklin, depois de ter perdido na Justiça o direito de ver o filho de 6 anos, prefere se abster.
Época: Seu livro é o desabafo de um homossexual discriminado ou uma vingança pessoal contra a LBV?
Pedro Almeida: Fui incentivado pela editora a contar minha história e, assim, quem sabe, ajudar pessoas em situação parecida. Desde os 16 anos, amarguei dúvidas sobre minha sexualidade. Saí com garotas, tive duas noivas, mas me sentia atraído por homens. Conheci o Franklin na LBV e minha vida mudou completamente. É o primeiro e único relacionamento homossexual assumido de cada um. Experimentamos durante três longos anos o pavor de ser descobertos. Nosso envolvimento chegou ao conhecimento de Paiva Netto por intermédio de pessoas próximas. Fomos delatados por um irmão e pela ex-mulher de Franklin. Resolvemos encarar o problema. Foi muito difícil revelar nossa situação, mas, de qualquer forma, prefiro passar pela crise a manter uma farsa.
Época: O livro é lançado justamente no momento em que a LBV é alvo de investigação na Justiça e na Câmara. Você planejou isso?
Almeida: Foi pura coincidência. Há um ano o livro consta do catálogo de futuras publicações da Editora GLS. Não é, portanto, um lançamento premeditado.
Época: Você foi, de fato, perseguido na LBV?
Almeida: Mesmo sendo uma das pessoas de confiança de José de Paiva Netto, fui perseguido por ser homossexual. Demitiram-me do cargo de gerente de comunicação por esse motivo. O preconceito na LBV, uma instituição que se diz humanitária e filantrópica, é devastador. Não só com relação aos gays. Não conheço nenhum negro na superintendência. Mulheres, quando eu estava lá, não duravam três meses em funções importantes.
Época: Você tinha consciência dessas discriminações?
Almeida: Eu sabia de homossexuais que foram demitidos sumariamente. Um funcionário gay, por exemplo, chegou a ser transferido de Estado para não ser demitido. Quando entrei com um processo trabalhista contra a LBV, esse mesmo rapaz foi obrigado a assinar uma carta que negava que a empresa discriminasse homossexuais. Era um documento grosseiro, encomendado, em que a palavra “discriminação” aparecia em letras maiúsculas. A testemunha só precisou assinar embaixo.
Franklin de Paiva: Ouvi de um defensor da LBV que a entidade jamais poderia ser preconceituosa porque estaria contrariando o próprio estatuto. Quando vieram à tona as denúncias mais recentes, divulgadas por jornais, eu também me lembrei que acumular patrimônio pessoal é vetado pelo estatuto. Muitos legionários supõem que eu tenha denunciado meu pai. Têm ódio a mim. Mas nem eu mesmo sabia que as denúncias eram tão graves.
Época: Calcula-se que, só em 2000, cerca de R$ 215 milhões, recolhidos entre os doadores, tenham sido desviados pela diretoria da LBV. Você, Franklin, era encarregado do marketing da entidade até 1997. Pedro trabalhava no setor editorial. Como assessores da diretoria, jamais desconfiaram do desvio de verbas?
Paiva: Alguns episódios me intrigavam. Em 1996, um dos diretores ordenou que eu mandasse confeccionar uma quantidade espantosa de cartões de Natal. O estoque, porém, tinha material suficiente para aquele ano; afinal esse tipo de produto não se perde. Perguntei por que encomendar mais, e não obtive resposta. Ser filho do presidente não me ajudou em nada. Ao contrário, ganhava um salário modesto, cerca de R$ 1.000, como um dos sete superintendentes da LBV. Nem sempre era convidado a participar das reuniões em minha área.
Época: Seu pai é acusado de possuir mansões em várias cidades brasileiras. Você não as conhecia?
Paiva: Fui criado entre as casas de São Paulo e do Rio de Janeiro. Não sabia explicar aquele luxo. Como meu pai era muito religioso e se dedicava em tempo integral à LBV, pensei que fosse normal ele receber um bom salário dos legionários. Acreditava que as pessoas o pagavam para administrar tudo. Depois soube que, pelo estatuto da LBV, presidente não recebe salário.
Época: A afinidade religiosa com a entidade superou as suspeitas?
Almeida: Eu acreditava em minha religião. Paiva Netto foi meu profeta durante muito tempo. Deu-nos uma missão. Isso está bem explicado no livro.
Paiva: Fomos envolvidos por uma crença com apelo espiritualista, que lidava com médiuns e tratava de fenômenos como o da incorporação. Os legionários acreditam que Alziro Zarur teria sido a encarnação de Allan Kardec, o fundador do espiritismo.
Almeida: Como Zarur não deixou herdeiros, Paiva Netto assumiu a condição de continuador de Kardec e se instalou na instituição como presidente vitalício.
Época: Quando a LBV passou a fazer parte de sua vida?
Almeida: Meus pais estão intimamente envolvidos com a instituição há 45 anos, portanto nasci na LBV. Tenho Zarur no nome para homenagear o fundador. Minha família chegou a doar a casa em que morávamos, em Aracaju, e passou a pagar aluguel no Rio de Janeiro. Nossa casa em Sergipe tornou-se um núcleo da LBV. Quando eu era pequeno, fui encarregado de montar para a entidade vasos de plantas cuja venda era revertida em benefício das crianças. Fui trabalhar aos 14 anos na sede do Rio, e saí de lá porque me tacharam de homossexual.
Época: Como é ser filho de um líder religioso de projeção nacional?
Paiva: Nunca fui próximo de meu pai, um homem eternamente ausente de casa. Eu e meus cinco irmãos sempre tivemos uma relação tensa com ele. Quando queria conversar sobre homossexualidade em casa, assunto que me angustiava, eu deparava com um bloqueio tremendo. Como Pedro, também nasci na LBV. Fui criado de maneira a jamais duvidar de meu pai como líder religioso e como administrador competente. Fiquei abalado com as denúncias contra ele.
Almeida: Foi convivendo com a família de Franklin que fiquei sabendo do imenso patrimônio de Paiva Netto. O mais chocante é que o presidente sempre pregou a pobreza. Muita gente abandonou emprego, carreira, para ganhar salários miseráveis na LBV. Há dez anos, Paiva Netto adotou a cantilena de Zarur, ao anunciar o fim do mundo em 2000. Disse que era preciso preparar os caminhos para a volta de Jesus. Dentre os cerca de 500 mil legionários, muitos fizeram voto de pobreza seguindo os preceitos da igreja. Fanáticos, doaram bens e alimentaram a igreja com dízimos. Meus pais fizeram isso.
Época: Quem deverá seguir a obra de Paiva Netto? A LBV sobreviverá aos escândalos?
Paiva: Não acredito que nenhum de meus cinco irmãos continue a missão. Está cada vez mais claro que o padrão de vida dos diretores não condiz com a missão da entidade.
Almeida: A impressão que eu tenho é de que Paiva Netto perdeu o fio da meada. Quando os diretores perceberam que ele estava enriquecendo, procuraram tirar vantagem. Hoje o presidente está cercado de gente que também construiu patrimônio pessoal com o dinheiro da LBV.
Paiva: Os legionários ainda acreditam que o trabalho seja sério. A LBV não pode ser penalizada por essa administração corrupta.
Época: Como está a relação com seu pai? Vocês estão mesmo rompidos?
Paiva: Não tivemos mais contato desde que ele soube que Pedro e eu estávamos juntos. Passei a falar com secretários. Quem me demitiu foi um de seus diretores, que me disse que não era bom para Paiva Netto ter um filho gay. Liguei, mandei fax, não obtive resposta. Estou há quatro anos sem conversar com meu pai.
Época: Pretende depor na CPI?
Paiva: Não posso. Pedro e eu precisamos nos resguardar de ameaças. O carro de Pedro foi sabotado. Um de meus irmãos o agrediu fisicamente. E a Justiça me impede de visitar meu filho. A LBV está pagando um advogado para alimentar a ira de minha ex-mulher. Isso é tudo muito complicado. Existe ex-marido, ex-amigo, ex-patrão. Mas não existe ex-irmão, ex-mãe, ex-pai. Minha relação está danificada. Paiva Netto, no entanto, é e sempre será meu pai.

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